O Homem que Morreu Cinco Vezes é um livro de contos surreais. Aliás, surreal é uma das características da obra literária de Astrogildo Miag, capaz de criar e dissecar temas tão estranhos e inimagináveis como ressuscitar o lendário Lampião e elegê-lo governador de Brasília. Ou criar uma cidade-purgatório onde amigos e inimigos reencontram-se após a morte. Ou virar pelo avesso a morte, o velório e a herança material deixada por um deficiente mental, cuja riqueza transportava em enorme saco pelas ruas da cidade. Assim é a literatura de Astrogildo Miag: o abstrato, o irreal e o inconsciente apresentados com lirismo e humor, não raramente destituídos da razão e da lógica triviais.
Neste livro aborda a quimera e impotência do homem, a exemplo do beato Vivaldo de Jesus, que obra milagres a partir do equilíbrio e da preservação da natureza. Traz a crítica social em A guerra, disputa entre Brasil e Canadá pela hegemonia do mercado de pequenas aeronaves. E os primeiros contatos com os macacos falantes, na foz do Rio São Manuel, que só existem na mente do escritor? O cavalo selado mostra que nem as pequenas comunidades salvam-se da violência; menos ainda as grandes cidades, a exemplo da paranoia de A história do carro vermelho.
Sempre a bordo de histórias hilariantes, em O terremoto mostra o abalo sísmico do Haiti, cotejando-o com o abalo político ocorrido na capital federal, quando o governador teve o mandato cassado. Amarildo e Índio da Amazônia registra a história de artista mambembe, cuja atração principal era um jacaré com mais de cinco metros de comprimento, que devorou o próprio artista em plena apresentação.
E a paranoia de alguém só dormir sentado em vaso sanitário, de preferência nas casas alheias? Pois, O homem do sanitário é um dos personagens irreais de Astrogildo Miag, assim como Genésio, o come rato e outros. Relata até o nascimento do MST: O batalhão de trabalhadores sem terra munidos de picaretas, enxadas e facões, bandeiras vermelhas simbolizando o sangue derramado, entra silenciosamente nas cidades à procura dos culpados pela mortandade de seus antepassados. Enquanto não os encontram, como tática de guerra, vão plantando acampamentos aqui, ali e acolá até o dia do juízo final. Quem são os culpados e qual seria a mortandade? A resposta encontra-se em MST, os primórdios.
Este é o retrato 3×4 do livro; o de corpo inteiro virá com a leitura do livro.
A interrogação acerca do título é inevitável e eis a resposta: cinco dos contos que compõem o livro têm como conteúdo e tema principal a quimera de supostas mortes do escritor, distribuídas ao longo do livro. Daí, O Homem que Morreu Cinco Vezes, mistura de ficção e realidade de forma cômica e hilária do primeiro ao último conto.